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Por que estão falando tanto de… quit-tok

Por que estão falando tanto de… quit-tok

Muito distante do quiet quitting, a prática de publicar vídeos que mostram a própria demissão nas redes sociais ganhou popularidade entre a fatia mais jovem da atual força de trabalho. O quit-tok, trend que já soma muitos adeptos no TikTok, mostra como estamos diante de um novo perfil profissional – e um novo desafio para o RH.

Produtividade tóxica e burnout: papo com Nubank e SafeSpace

O episódio 3 do Papo Cajuína foi uma conversa franca sobre o que as empresas podem fazer para lidar com esse tipo de problema

Luiza Terpins
14 de abril de 2022
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Quem nunca deu uma choradinha no meio do expediente? Ou precisou de uns 10 minutos olhando para o “nada” para se acalmar depois de uma reunião? Ou, do ponto de vista do gestor ou do RH, quem nunca se sentiu perdido ao perceber que a equipe estava sofrendo com problemas emocionais causados pelo trabalho? Assuntos como burnout e produtividade tóxica estão cada vez mais em alta no mercado corporativo, e não à toa, burnout foi classificado como doença ocupacional pela OMS no início do ano – segundo a International Stress Management Association (Isma), estima-se que 30% dos trabalhadores brasileiros sofram com a síndrome.

Felizmente, as empresas estão se preocupando cada vez mais com o bem-estar dos colaboradores, seja através de uma área específica dentro de RH, ou apostando em ferramentas como canais de escuta. É sobre isso que falamos no episódio 3 do Papo Cajuína, o nosso podcast! Recebemos na mesa Daniel Wara, Employee Relations Lead do Nubank; e Rafaela Frankenthal, cofundadora da SafeSpace. A conversa já está no nosso canal nas principais plataformas de streaming, mas você pode ler o que rolou aqui também.

Antes de começar, Daniel, conta para a gente o que faz um Employee Relations?

Employee relationship é uma área recente no Brasil, que começou a ganhar mais atenção porque cada vez mais se dá importância à relação entre quem está trabalhando e a empresa, desde como resolvem os conflitos, como a empresa se posiciona e ajuda a solucioná-los.

Employee relationships, em geral, é responsável por investigações de denúncias. Muitas empresas possuem canais de denúncia que garantem o anonimato da pessoa – a SafeSpace eu acredito que tenha parte nessas ações. Essa área também pensa em formas de fazer com que a liderança da empresa trabalhe para ter uma cultura mais saudável e segura. O que fazer e o que não fazer, quais cuidados tomar. Isso tudo gira em garantir a segurança dentro do ambiente de trabalho.

Rafa, como surgiu a ideia de fundar a SafeSpace? Teve algum gatilho em específico?

Foram alguns gatilhos. A SafeSpace surgiu de um interesse pessoal meu de trabalhar com algo que tivesse um impacto positivo significante na sociedade. Eu trabalhava com marketing em startup, decidi sair do meu emprego, me mudar para Londres e fazer mestrado em estudo de gêneros, aí fui entrando no meio acadêmico. Ao fazer uma pesquisa sobre assédio sexual especificamente eu fui ligando os pontos.

Já tinha vivido situações em ambiente de trabalho e não tive acesso a ferramentas que me deixassem confortável o suficiente para manifestar essas questões internamente. Sabia que isso era uma realidade para muita gente também. Aí, eu conheci alguma soluções que estavam inovando nessa frente, criando ferramentas de compliance mais modernas. Comecei a falar com gente de recursos humanos e a entender que as empresas ainda usavam canais de denúncia que operam da mesma forma há anos e que ao mesmo tempo a gente estava enfrentando uma mudança gigante na exigência que as pessoas têm em relação a bem-estar no trabalho.

Enxerguei uma oportunidade grande de inovar e criar uma solução melhor, trazendo tecnologia para um processo que sempre foi analógico. Foi caminhando e hoje a SafeSpace está crescendo super rápido, estamos com mais de 60 clientes depois de um ano e pouco de operação. É um reflexo de toda essa transformação que a gente está vendo, e a pandemia também deu uma acelerada.

Tem algum perfil de clientes que procuram a SafeSpace?

Hoje, a gente atende empresas com perfis e setores diferentes. Mas a maioria deles são empresas de tecnologia, que entendem a importância de investir em cultura e inclusão. Problemas de comportamento acontecem em todos os ambientes de trabalho. Empresas que já investem em cultura já têm uma postura pró-ativa, entendem que não é o fim do mundo. Mesmo quando a empresa vem até a gente sabendo que teve um problema e precisa melhorar por causa daquele problema específico, é sempre com uma visão e entendimento que quando você melhora o processo, você não está só reagindo, você também está plantando a sementinha ali para que da próxima vez o impacto seja menos pior. Não dá para prevenir 100%, o que é possível é ter processos que vão permitir a identificação cedo e de uma forma que vai danificar menos o bem-estar das pessoas envolvidas.

Daniel, quais diferenças você sente em organizações que já têm um tamanho muito grande e aquelas que estão se aprimorando nesse tema?

Eu vejo mais semelhanças do que diferenças. É muito importante que as empresas tenham essa consciência e é muito legal ver que as startups estão identificando isso ao passo que estão crescendo. Enquanto empresas muito grandes só começaram a olhar o assunto recentemente, empresas jovens já trazem isso consigo.

O fato de ter tecnologia que apoia esse processo é igualmente relevante, o que não quer dizer que é só por conta da tecnologia, existe o fator humano por trás. Não adianta ter uma tecnologia robusta se as pessoas que estão usando essa tecnologia têm a mentalidade antiga. Isso é um sinal de que os tempos mudaram, o foco é nas pessoas e as empresas estão olhando isso também. Todo o ecossistema ganha.

Como as pessoas têm usando as ferramentas para ser mais inclusivo e aumentar a diversidade em um momento que tantas gerações diferentes estão trabalhando no mesmo espaço?

RAFAELA: Eu acho que as coisas mudaram muito em termos do nível de exigência que colaboradores têm em relação à gestão e à responsabilidade da empresa em criação de cultura. Isso se deve ao avanço das mídias sociais, na facilidade das pessoas de conversarem, entenderem como é o mundo corporativo como um todo. Alguns anos atrás, a cultura das empresas não era tão transparente. Isso vai empoderando a força do trabalho e exercendo uma certa pressão nas empresas. A velocidade que a informação consegue correr, a facilidade de saber como é o ambiente de trabalho em outros países, outros setores. Com isso, surgem ferramentas que permitem que as pessoas enxerguem como é a cultura do ambiente de trabalho, aí você acaba colocando as empresas em uma posição que elas têm que reagir para acompanhar essa transformação, senão os melhores talentos vão buscar as empresas que fazem isso.

DANIEL: Do ponto de vista da empresa, ao passo que as empresas trazem um cuidado maior com a segurança psicológica de cada um, isso também traz para as pessoas uma maior auto-responsabilidade de como ajudar nesse processo e não atrapalhar ele.

Na minha experiência, muitas vezes alguns temas eram reportados como assédio ou conduta errada, mas quando você ia investigar, a pessoa se enganou, não falou com a outra. Houve uma terceirização desse processo de você também interagir com seu líder. Essas ferramentas não vêm para criar barreiras, vêm para tirar elas e promover um ambiente melhor.

RAFAELA: A transparência joga para os dois lados, né? Você ter mais informação sobre os locais coloca mais pressão nas empresas, mas do outro lado também. As pessoas conseguem ter uma noção muito mais clara do que é trabalhar com aquele indivíduo específico. Com uma cultura mais transparente, sua posição lá dentro e seu impacto na cultura ficam mais evidente.

DANIEL: São pontos complementares. Tem os 50% que a empresa é responsável e a outra metade das pessoas para manter a saúde do ambiente.

Qual o processo ao identificar o problema? Qual o primeiro passo depois da denúncia?

DANIEL: O primeiro passo é entrar em contato com alguns dos canais disponibilizados ou por telefone. Faz o reporte, inclui as informações e isso é filtrado até chegar no rh/employee relationships da empresa. Essa denúncia é apurada através de entrevistas com pessoas que tiveram contato com os envolvidos, revisão de informações, e-mails e ao final desse processo tem um entendimento e é alinhado um plano de ação que faça sentido.

O que eu vejo que é importante ao identificar algo errado é fazer essa avaliação e trazer o máximo de informação possível para esse relato, porque é com base nessas informações que as empresas vão conseguir apurar e tomar a melhor ação. É importante que as informações estejam claras e o mais detalhadas possível.

RAFAELA: Do ponto de vista da SafeSpace, uma opção de canal, nós nos adequamos ao processo de cada empresa, mas a nossa ferramenta ajuda em alguns dos desafios mencionados pelo Daniel. A gente tem funcionalidades que permitem guardar evidência com data e hora marcada se a pessoa não estiver pronta para fazer o relato, um fluxo estruturado que evita que a pessoa faça um relato sem as informações mínimas, a nossa tecnologia estrutura as informações de maneira mais robusta, permitindo que quem estiver administrando ligue os pontos. Então, nós damos ferramentas para as empresas aprimorarem os seus processos, mas cada empresa tem os seus métodos.

Como a cultura de cada empresa impacta no trabalho de vocês?

RAFAELA: A cultura da empresa impacta muito na forma como problemas de comportamento são tratados. A cultura já impacta na forma como as pessoas usam ou não um canal de escuta. Empresas que não falam muito sobre inclusão, por exemplo, costumam ter uma cultura voltada para o silêncio, onde as pessoas vão ter muitas dificuldades para se manifestarem. Quando a gente está falando de problemas de assédio, discriminação, quando tem tabu, as pessoas tem dificuldade de entender se foi ou não, e quando você tem uma cultura de silêncio e não estimula as pessoas a falarem sobre assuntos delicados, você permite que esse tabu continue e fique muito mais difícil de lidar.

A gente fala muito sobre isso na SafeSpace, a importância de abrir um espaço para escuta. A gente usa esse termo ao invés de denúncia, porque queremos fugir desse tom pejorativo. Nós temos um posicionamento positivo, voltado para a inclusão, um espaço seguro, porque quanto mais cedo as pessoas colocarem o problema, mais chance a empresa vai ter de resolver internamente e quanto mais as pessoas se sentirem confortáveis para falar sobre o assunto, mais elas vão entender o que deve ser colocado nos canais. Essa talvez seja a principal diferença em culturas que têm menos abertura.

DANIEL: Tem dois pontos que eu gostaria de ressaltar. Culturas, sobretudo no recorte do Brasil, reforçam esses padrões e  a gente está vendo uma mudança. É um momento muito legal, mas é importante ressaltar que é um recorte populacional muito específico. A grande maioria dos trabalhadores nesse país não tem acesso às ferramentas que a gente está falando aqui.

Agora, sim, culturas tradicionais têm esse resquício, mas não quer dizer que não possam ser mudadas. Eu tive experiências em empresas bem tradicionais, e quando essa estrutura de employee relationships foi criada existia muito medo das pessoas colocarem seus relatos e perderem seus empregos. À medida que foi feito um trabalho de conscientização e as pessoas foram vendo que a abordagem usada era leve, apesar dos temas serem densos, elas começaram a criar uma confiança maior no processo e a cultura aos poucos foi mudando. Ela é totalmente aberta hoje? Não, mas teve uma virada de chave.

Como é a apresentação do serviço para um cliente novo?

DANIEL: As possibilidades de relatar um problema são comunicadas desde o início, mas a gente vê que a tendência é que as pessoas não usem o canal em um espaço de 6 meses a um ano, porque não se sentem seguras o suficiente para fazer um relato. Existem exceções, mas a tendência é essa, até as pessoas entenderem como funciona. Isso independe do processo de comunicação, as pessoas têm essa resistência nesse primeiro momento por uma questão cultural.

RAFAELA: A SafeSpace faz um trabalho para tentar melhorar esse cenário e ajudar a gerar confiança. A gente faz uma apresentação, compartilhamos conteúdos com a empresa, justamente porque é importante comentar a parte da imparcialidade, é importante as pessoas saberem onde ficam os dados, como elas acompanham, que a tecnologia permite evitar conflitos de interesse. A gente consegue apresentar isso de maneira transparente para tentar diminuir esse tempo de adaptação para as pessoas entenderem que mesmo sendo novas na empresa, elas podem usar o canal.

Quando a gente apresenta o canal para uma empresa, se ela não tinha canal nenhum antes, é comum que depois da adaptação tenha um pico, com relatos que aconteceram antes e as pessoas não tinham onde falar. Depois, estabiliza, mas depende muito do contexto, da organização, da estrutura. Têm perfis de empresa que terão muito mais relatos.

Vocês têm identificado tendências na área? Ou mudanças nos últimos dois anos?

DANIEL: Em primeiro lugar, a pressão sobre as pessoas pela produtividade no trabalho remoto. As reuniões são uma atrás da outra, é uma dinâmica diferente. As pessoas estão em um nível de estafa nunca visto antes e o fato das instituições estarem vendo isso, criando mecanismos como a classificação de burnout como doença ocupacional, para ajudar em um processo de criação de políticas públicas, mecanismos para proteger as pessoas, é sensacional e a gente vê que está acontecendo. É um processo global que eu vejo que já mudou.

Outro ponto que eu vejo que já mudou é a crescente preocupação das empresas com o bem-estar das pessoas. Não só com os programas de saúde mental, mas do ponto de vista de estratégia de negócio, como as empresas ajudam as pessoas a priorizarem os trabalhos e pensarem em formas de trabalhar em uma dinâmica mais saudável.

RAFAELA: Para complementar a resposta do Daniel, a pandemia acostumou a gente muito mal, porque de repente as empresas foram para o trabalho remoto sem nenhum modelo. Do ponto de vista individual, não tinha o que fazer, porque não podia sair de casa, a vida das pessoas se tornou o trabalho. Tomando café da manhã enquanto já está em uma reunião, trabalhando de pijama…Isso acaba confundindo você, porque você não tem um começo e um término fixos, mudar a cabeça de quando você está trabalhando e quando está descansando. Fica tudo em um bolo só, gerando ansiedade e estresse, porque você nunca desliga.

Como educar a liderança nesse sentido da pressão? Do funcionário estar disponível o tempo todo?

RAFAELA: É muito importante se colocar no lugar do outro, ter mais empatia e ser mais curioso para entender outros contextos. Sendo solteiro, sem filhos, durante a pandemia, talvez você possa trabalhar por 12h e até queira, mas isso é completamente diferente de uma mãe que antes deixava a filha na creche e agora os filhos não estão na escola. Para essa pessoa, a vida está de ponta cabeça. Se você não faz um exercício desse olhar, é muito fácil colocar todo mundo na mesma caixinha e aí você vai ter uma pessoa produzindo o dobro, outra produzindo metade, e isso não tem a ver com a capacidade de cada um. Cabe à empresa equilibrar e talvez isso signifique tratar as pessoas de maneiras diferentes. Ainda mais quando você tem uma maioria de homens brancos nos cargos de liderança, é importante ter a vontade de entender outros contextos.

DANIEL: Não é um trabalho fácil. A gente está em uma cultura voltada para a produtividade a qualquer custo. Eu acho que o que a Rafa falou é muito relevante, mas muito difícil de abordar. Tem empresas que estão fazendo um bom trabalho, acho que em termos de conscientização esse é o caminho.

O Brasil é o segundo país do mundo que mais sofre com burnout, segundo dados da Associação Internacional de Gestão de Estresse. É estimado que 30% dos trabalhadores do Brasil sofram de burnout, um dado muito preocupante. De que forma a gente, considerando a nossa cultura, o contexto social, consegue achar um caminho para eliminar esse problema? Acho que vai demorar um bom tempo ainda. Estamos no caminho certo, mas dá para acelerar mais.

E o que fazer quando o RH sofre de burnout?

DANIEL: O autoconhecimento é muito importante, mas tem o outro lado. O ambiente propicia isso. O exercício que eu fiz em pelo menos duas vezes que cheguei em um estado de burnout foi entender quem eram as pessoas que poderiam me apoiar e eu tive esse apoio da minha liderança. Conversei com meu líder e falei que não daria conta da demanda de prioridades e precisava de ajuda. Aí, essa liderança, de uma forma muito empática, me ajudou a priorizar. Aos poucos, eu fui tirando o volume de trabalho que não era prioritário, prazos tiveram que ser negociados, mas aos poucos eu fui chegando em um lugar de mais tranquilidade, que me possibilitou respirar e ficar tranquilo que aquilo tinha passado.

Então, entender quem são as pessoas dentro da sua rede que podem te ajudar nesse caminho. Idealmente, a gestão, seu/sua líder, mas a gente sabe que muitas vezes isso não acontece.

O que vocês estão lendo ou assistindo para se inspirar?

RAFAELA: Não é o livro que eu estou lendo agora, é o último que eu li, mas acho que se encaixa muito no papo que a gente teve aqui. Chama “Contagious” e fala como ideias novas se espalham. É um livro de marketing, mas tem muito a ver com transformação, movimentos sociais, então foi uma leitura que me trouxe muita inspiração para entender como a gente consegue pegar essa transformação acontecendo na cultura e trazer isso para contaminar as outras pessoas. Eu acho que é bom tanto para o marketing quanto para o ponto de vista mais aberto, que tem a ver com a SafeSpace.

DANIEL: Eu estou lendo um livro que se chama “Organização sem medo”. É de uma autora de Harvard, que fala sobre segurança psicológica e como equipes que têm essa segurança produzem mais, inovam mais. Outra forma de inspiração é ler artigos sobre o futuro do trabalho. Quanto mais informações a gente tiver e mais acesso a esses temas, melhor. A gente consegue adaptar as estratégias e fazer com que as pessoas tenham um ambiente de trabalho melhor.

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Luiza Terpins é Editora de Cajuína e Líder de Conteúdo e Comunicação da Caju.

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